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8. Gloriosus Deus (1253)

Como conta a Legenda de Santa Clara (LSC 47), o Papa Inocêncio IV mandou cantar a Missa das Santas Virgens nas exéquias da Santa. Advertido pelo Cardeal Reinaldo de Segni de que isso equivaleria a canonizá-la, voltou atrás. Mas, já no dia 18 de outubro de 1253, apenas dois meses depois da morte de Clara, assinou esta bula mandando que se fizesse o Processo de Canonização. Como o Papa não se refere a nenhum pedido para esse processo, como era costume, concluímos que a iniciativa foi dele mesmo. 
Nas três primeiras edições das Fontes Clarianas, fizemos a tradução diretamente da versão umbra anexa ao Processo, que possuímos, pois não tínhamos acesso ao Bullarium Franciscanum. Nossa nova tradução é direta do latim. 
O texto latino autêntico e autógrafo está guardado no arquivo do Proto-mosteiro de Santa Clara em Assis, trazendo ainda o sigilo de chumbo que caracterizava as bulas. Nós o tiramos do BF I, pág. 684-685, nº 504.

TEXTO ORIGINAL

8. Gloriosus Deus (1253)

Venerabili Fratri [Bartolomeo] Episcopo Spoletano Salutem et Apostolicam Benedictionem. 
1 Gloriosus Deus in Sanctis suis, qui facit mirabilia magna solus, fideles suos, quos ad supernae praemia gloriae ac caelestis beatitunis bravium eligit, post cursum et transitum hujus vitae multímoda, et miranda signorum ostensione declarat; ut per signa et prodigia, et talium, tantorumque testimonia mirabilium, quae unius in trinitate, et trini in unitate Dei tantum possibilia sunt potentiae, intellecta quasi virtus conspiciatur Altissimi; et reverentius adoretur magnum, et admirabile nomen ejus in terris, cujus manet in aevum imperium, tonatque majestas mirifice in excelsis. 
2 His utique desiderabilibus illecta praemiis sanctae memoriae Clara, abbatissa pauperum inclusarum Monialium S. Damiani Assisinatis attendens illud propheticum: Audi Fi lia, et vide, et inclina aurem tuam, et obliviscere populum tuum,et domum patris tui, quia Rex tuam speciem concupivit: caducis, et transitoriis terga dedit; seque ad anteriora convertens omnino posteriorum oblita pronum, et promptum sancto praebuit auditum oraculo; 
3 non fuit in mora prosequendi celeriter, quod delectabat audire; moxque abnegans se, suosque, et sua, Christum pauperem Regem Regum adamavit in sponsum adolescentula jam regalis; seque ipsi in et humilitatis spiritu mente et corpore totaliter devovens, haec duo praecipue bona pro dote quase spopondit eidem paupertatis donum, votumque castmoniae virginalis: 
4 sicque juncta est virgo pudica desideratis virginis sponsi amplexibus; et de intemeratae virginitatis thalamo admiranda cunctis, foecunda, castaque proles prodiit, quae sub sanctae suae conversationis odore, ac amore salutaris ad modum professionis Deo affluenter, ut plantatio caelestis fructificat per cuncta fere mundi climata dilatata. 
5 Haec inquam sponsa, dum hic vixit mortua quidem mundo, sic Altissimo placuit affectibus, efetibusque virtutum, et salutarium studiis operum, quod postquam feliciter obiit, quin potius abiit de hoc seculo, pia Remuneratoris omnium bonorum dignatio, quae suae abundantia pietatis et merita supplicum excedit, et vota, pro sui exaltatione nominis, quod est gloriosum in secula, claris ipsius Clarae meritis interpellationibus apud eum, magna praestare fertur petentibus beneficia; multaque pro ea, ejusque interventu in terris, et varia miracula operari. 
6 Cum igitur dignum, debitumque nimis existat, ut illa , quam Divina clementia dicitur Venerabilem suis Fidelibus exhibere per gratiarum hujusmodi munera, et miraculorum insignia percolenda, in militanti Ecclesia honoretur; Fraternitati tuae per Apostolica Scripta mandamus, quatenus de vita, conversione, et conversatione ipsius, ac de praedictis miraculis, eorumque circumstantiis universis inquiras secundum interrogatoria, quae sub Bulla nostra tibi mittimus interclusa, diligenter et sollicite veritatem: 
7 et quae super praemissis inveneris, fideliter publica manu conscripta sub tuo sigillo Nobis studeas destinare; ut cujus anima stola immortalitatis in caelis laetari jam creditur, dignis sic laudibus eam devota justorum concio prosequatur.
Datum Laterani XV. Kal. Novembris Pontificatus Nostri Anno Undecimo.

TEXTO TRADUZIDO

8. Gloriosus Deus (1253)

Ao venerável irmão Bartolomeu, Bispo de Espoleto, saúde e bênção apostólica. 
1 Deus, glorioso em seus santos, que faz e opera sozinho grandes maravilhas, ilustra, depois do correr e da passagem desta vida, os fiéis que escolhe para os prêmios da eterna glória e da bem-aventurança eterna pela demonstração variada e admirável de sinais. Dessa maneira, ouvindo falar dos sinais, prodígios e testemunhos de tais e tantas coisas maravilhosas, só possíveis ao poder de Deus, uno na Trindade e trino na Unidade, nós podemos quase que ver a virtude do Altíssimo e o seu nome grande e maravilhoso pode ser mais reverentemente adorado na terra, pois o seu império permanece eternamente e sua majestade destaca-se admiravelmente no excelso. 
2 Atraída por esses desejáveis prêmios, a bem-aventurada virgem Clara, de santa memória, que foi abadessa das pobres monjas inclusas de São Damião, em Assis, atendeu ao que disse o profeta: Ouve, filha, e vê e inclina teu ouvido: esquece teu povo e a casa do teu pai, pois o Rei desejou a tua beleza (Cfr. Sl 44,11-12). Virou as costas para o que é caduco e transitório e, voltando-se para as coisas que tinha à sua frente, esqueceu as de trás e prestou ouvido atento e pronto à voz de Deus. 
3 Não perdeu tempo para cumprir prestamente o que lhe deleitava ouvir, mas, imediatamente, abnegando a si mesma, a seus parentes e ao que era seu, feita já uma adolescente real, amou como esposo Cristo pobre, Rei dos reis. E, devotando-se a ele totalmente, com a mente e com o corpo em espírito de humildade, prometeu-lhe especialmente estas duas coisas boas como dote: o dom da pobreza e o voto da castidade virginal. 
4 E assim a virgem pudica uniu-se aos desejados abraços do esposo virgem, e do leito da intemerata virgindade procedeu a prole casta e fecunda que todos admiram e que, pelo odor de seu comportamento santo e pelo amor de sua profissão salutar, é uma planta celestial que se espalhou por quase todo o mundo e dá frutos abundantes para Deus. 
5 Direi que esta esposa, enquanto aqui viveu, morta para o mundo, agradou tanto ao Altíssimo, pelo desejo e a prática das virtudes e pelo esforço de suas obras salutares, que, depois de sua morte feliz, e mesmo antes de sair desta vida mortal, contam que, por mercê do Remunerador de todos os bens, o qual, pela abundância de sua piedade vai além dos méritos e desejos dos suplicantes, para exaltação do seu nome, que é glorioso para sempre, pelos claros méritos da própria Clara concede grandes benefícios aos que o pedem e realiza por sua intercessão muitos milagres. 
6 Por isso, sendo muito digno e oportuno honrar na Igreja militante aquela que a divina clemência quis tornar venerável diante de seus fiéis pelo dom de tais graças e pela dignidade dos milagres que devemos respeitar, ordenamos por carta apostólica à tua Fraternidade que pesquise diligente e solicitamente a verdade sobre sua vida, conversão e comportamento, e também sobre os sobreditos milagres e todas as suas circunstâncias, de acordo com as perguntas que mandamos anexas a esta Bula. 
7 E o que encontrares sobre essas coisas, trata de mandá-lo a nós sob o teu selo, escrito fielmente por público notário, para que a alma daquela que acreditamos já estar alegre no céu, no gozo da veste da imortalidade, seja seguida neste mundo pela multidão dos justos, com dignos louvores. 
Dado no Latrão, no décimo quinto dia das Calendas de novembro, no décimo primeiro ano de nosso pontificado.