Página de Estudos das Fontes Pesquisadas

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TEXTO ORIGINAL

Speculum perfectionis - 100

Caput 100. De tentatione quam habuit per mures de qua consolatus est eum Dominus et tunc certificavit eum de regno suo.

1 Duobus annis ante obitum suum, dum esset apud Sanctum Damianum in cellula quadam facta de storiis, et summe affligeretur ex infirmitate oculorum, ita quod ultra spatium dierum non potuit videre lumen diei nec etiam lumen ignis, 2 factum est divina permissione ut, ad augmentum afflictionis et meriti sui, venirent tot mures in cellam illam quod, die noctuque discurrentes supra ipsum et in circuitu ejus, non sinebant eum orare nec quiescere. 3 Immo, quando comedebat, ascendebant super mensam ejus et ipsum plurimum infestabant; unde tam ipse quam socii ejus cognoverunt manifeste quod erat tentatio diabolica.
4 Videns ergo beatus Franciscus se tot afflictionibus cruciari, quadam nocte, motus pietate circa seipsum, dixit intra se: “Domine, in auxilium meum respice (cfr. Ps 70,12) super infirmitates meas, ut eas patienter valeam tolerare”.
5 Et statim in spiritu dictum est ei: “Dic mihi, frater, si quis pro iis tuis infirmitatibus et tribulationibus tam magnum et pretiosum thesaurum tibi daret, 6 quod si tota terra esset purum aurum, omnes lapides essent lapides pretiosi et tota aqua esset balsamum, tu omnia pro nihilo haberes in comparatione illius (cfr. Sap 7,9) magni thesauri, nonne multum gauderes?” 7 Et respondit beatus Franciscus: “Magnus esset, Domine, thesaurus iste et pretiosus valde atque nimis amabilis et desiderabilis (cfr. Ps 18,11)”.
8 Et audivit iterum (cfr. Apoc 10,8)  dicentem sibi: “Ergo, frater, jucundare et jubila in tuis infirmitatibus et tribulationibus, atque de cetero ita secure te habeas ac si jam esses in regno meo”. 
9 Et surgens mane, dixit sociis suis: “Si Imperator alicui servo suo integrum Regnum daret, nonne ille servus multum deberet gaudere? Si autem totum Imperium daret ei, nonne multo magis gauderet?” 10 Et ait illis: “Ergo me oportet amodo multum gaudere in infirmitatibus et tribulationibus meis (cfr. 2Cor 12,10)atque in Domino confortari (cfr. Eph 6,10) et sernper gratias agere Deo Patrt et unico Filio ejus Domino Jesu Christo (cfr. Eph 5,20) et Spiritui sancto de tanta gratia mihi facta a Domino; 11 videlicet quia dignatus est me indignum servum suum adhuc viventem in carne certificare de regno suo.
12 Unde volo ad laudem ejus et ad nostram consolationem et ad aedificationem proximi facere novam laudem de creaturis Domini, quibus quotidie utimur et sine quibus vivere non possumus, et in quibus humanum genus multum offendit Creatorem. 13 Et continue sumus ingrati tantae gratiae et tanti beneficii, non laudantes Dominum creatorem et datorem omnium bonorum, sicut deberemus”. Et sedens, coepit meditari aliquantulum.
14 Et postea dixit: “Altissimo, omnipotente bono Signore”, etc., et fecit cantum super hoc, et docuit socios suos ut dicerent et cantarent eum. 15 Nam spiritus ejus erat tunc in tanta consolatione et dulcedine quod volebat mittere pro fratre Pacifico, qui in saeculo vocabatur rex versuum et fuit valde curialis doctor cantorum; 16 et volebat dare sibi aliquos fratres bonos et spirituales, ut irent simul cum eo per mundum praedicando et cantando laudes Domini. 17 Dicebat enim quod volebat quod ille qui sciret melius praedicare inter illos prius praedicaret populo, et post praedicationem omnes cantarent simul laudes Domini, tanquam joculatores Domini.
18 Finitis autem laudibus, volebat quod praedicator diceret populo: “Nos sumus joculatores Domini, et pro iis volumus in hoc remunerari a vobis, videlicet ut stetis in vera paenitentia”. 19 Et ait: “Quid enim sunt servi Dei nisi quidam joculatotes ejus, qui corda hominum erigere debent et movere ad laetitiam spiritualem? 20 Et hoc specialiter dicebat de fratribus Minoribus qui dati sunt populo Dei pro ejus salute.

TEXTO TRADUZIDO

Espelho da Perfeição - 100

Capítulo 100. A tentação que teve por meio dos ratos,  da qual o Senhor o consolou e, então, lhe assegurou o seu reino.

1 Dois anos antes de sua morte, quando estava em São Da­mião numa pequena cela feita de esteiras e era muitíssimo ator­mentado pela doença dos olhos, a ponto de não poder ver a luz do dia nem a do fogo por mais de cinqüenta dias, 2 aconteceu que, por divina permissão e para aumentar seu sofrimento e seu méri­to, entraram na cela tantos ratos que, correndo dia e noite sobre ele e em volta dele, não o deixavam orar nem descansar. 3 Além disso, quando comia, subiam sobre sua mesa e o atormen­tavam muito; tanto que ele e seus companheiros compreenderam claramente que se tratava de uma tentação diabólica.
Vendo-se mortificado por tantas provações, uma noite, com pena de si mesmo, o bem-aventurado Francisco disse no seu interior: “Senhor, vinde em meu auxílio (cf. Sl 70,12) na minha doença, para que eu possa suportá-las com paciência”.
5 E logo lhe foi dito em espírito: “Dize-me, irmão: se, por es­tas tuas enfermidades e tribulações, alguém te desse um tesouro tão grande e precioso 6 que, se toda a terra fosse puro ouro, todas as pedras fossem pedras preciosas e toda a água fosse bálsamo, tu as considerarias um nada em comparação (cf. Sb 7,9) com tão grande tesouro, não te alegrarias muito?”7 Respondeu o bem-aventurado Francisco: “Tal tesouro, Senhor, seria grande e muito precioso, muito agradável e desejável (cf. Sl 18, 11).
8 ouviu de novo (cf. Ap 10,8) que lhe dizia: “Pois então, irmão, alegra-te e rejubila-te em tuas enfermidades e tribulações e, de resto, fica tão tranqüilo como se já estivesses no meu reino”.
9 Levantando-se de manhã, disse a seus companheiros: “Se o imperador desse um reino inteiro a um de seus servos, não deve­ria o servo alegrar-se muito? Se, porém, lhe desse todo o império, não deveria alegrar-se muito mais?” 10 E acrescentou: “Portanto, devo realmente alegrar-me muito nas minhas enfermidades (cf. 2Cor 12,10) e tribulações, ser confortado no Senhor (cf. Ef 6,10) e sempre dar graças a Deus, Pai (cf. Ef 5,20), a seu único Filho, o Senhor Jesus Cristo, e ao Espírito Santo pela grande graça que o Senhor me deu, 11 pois se dignou assegurar seu rei­no a mim, seu indigno servo, vivendo ainda na carne.
12 Por isso, para seu louvor, para nossa consolação e para a edificação do próximo, quero compor um novo Louvor das Criaturas do Se­nhor, das quais nos servimos diariamente, sem as quais não po­demos viver e nas quais o gênero humano ofende muito o Cria­dor. 13 E constantemente somos ingratos por tão grande graça e tão grande bene­ficio, não louvando o Senhor, criador e doador de todos os bens, como deveríamos”. E, sentando-se, começou a meditar por al­gum tempo.
14 Depois disse: “Altíssimo, onipotente e bom Senhor” etc. e fez um canto sobre isso e o ensinou a seus companheiros para que o recitassem e cantassem. 15 Pois seu espírito estava em tanta consolação e doçura que mandou chamar Frei Pacífico, que no mundo era chamado rei dos ver­sos e foi um mestre de canto muito cortês; 16 e queria dar-lhe alguns frades bons e espirituais, para que fossem com ele pelo mundo pregando e a cantando os louvores do Senhor. 17 Disse que queria que quem dentre eles soubesse pregar melhor, pregasse primeiro ao povo e, depois da pregação, todos cantassem juntos os louvores do Senhor, como jograis do Senhor.
18 Terminados os louvores; queria que o pregador dissesse ao povo: “Nós somos jograis do Senhor e a recompensa que queremos receber de vós é que permaneçais na verdadeira penitência”. 19 E disse: “Pois, que são os servos de Deus, senão seus jograis, que devem erguer os corações dos ho­mens e levá-los à alegria espiritual?” 20 Dizia isso especialmente dos frades menores, que foram dados ao povo de Deus para sua salvação.