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16. De Conditoris omnium (1238)

Uma exortação a Santa Inês de Praga escrita por Gregório IX no dia 9 de maio de 1238 é a resposta a uma carta da Santa que deve tê-lo deixado muito impressionado. Colocamos aqui este documento para entendermos um pouco mais o amor de Santa Clara por Santa Inês e para lamentar que ainda não tenha sido descoberto nenhum documento escrito pela Santa de Praga. Queremos ressaltar que, apesar da imensa admiração e carinho que Gregório IX teve por Francisco, Clara (a rainha do sul) e Inês, não entendeu o mais profundo de sua proposta e sempre tentou impor-lhes a sua maneira de ver. São elementos para entendermos a luta de Clara e Inês por uma regra franciscana. Texto latino em BF I, págs. 241-242, n. 248.

TEXTO ORIGINAL

16. De Conditoris omnium (1238)

Dilectae filiae Agneti ancilla Christi et gloriosae Virginis in mulieribus benedictae salutem et apostolicam benedictionem
1 De Conditoris omnium ineffabili gratia, et virtute procedit, quod contemplationis suae Spiritus sic in alta coelorum erigitur, ut ab ipso et abyssi profunditas penetretur; prout innuitur ex Dei magnalium varietate mirabili, quam pridem in tuae sinceritatis litteris expressisti. 
2 Ex ipsa enim collegimus exultantes, quod tu in Aquilonis partibus constituta, relictis Terrae finibus, qui sunt cupiditas, vanitas, et voluptas in se stultorum oculos defixos habentes, cum Regina austri audire processeritis veri sapientiam Salomonis, circa cujus pedes, tanquam in schola virtutum, pervigil et sedula perseverans ibi sic ad plenum bonitatem, disciplinam et scientiam didicisti, ut suae voluptatis torrente potata, ex hoc in illud eructes, nunc de thesauro tui pectoris fervorem desiderii novi proferens, nunc circa executionem veteris incommutabilem voluntatem exponens. 
3 Super hoc quidem nato gloriosae Virginis, cui, sua disponente clementia, obtulisti candorem munditiae virginalis, quas possimus, gratias exhibentes ex intimo cordis affectu tibi benedictionis filia suademus, ut in his, quae sola Dei virtus in te operata dignoscitur, nihil homini, sed totum adscribere studeas Creatori, a quo mirabiliter angelorum et hominum ministeria dispensante cuncta bona, principium, et perfectionis suscipiunt complementum, coronam perenis gloriae obtentu devotionis, et fidei consequentibus subditis, per quos idem quase per instrumentum suae beneplacitum exequitur voluntatis; 
4 sicut in modernorum speculo Beato Francisco gloriantes in Domino contemplamur, qui nutu Regis aeterni de spina subito translatus in florem, postpositis mundi falaciis ad cultum continuae transiens puritatis, commissae sibi desuper gerendo fideliter legationis officium, Patris aeterni Filio grande lucrum attulit animarum, institutis per ipsum specie stigmatum Redemptoris, sicut pluribus dignis fide patuit insignitum, per orbis latitudinem tribus Ordinibus, in quibus per dies singulos cunctipotens redditur multipliciter gloriosus.
5 Intus enim quasi tribus propaginibus invite contentis, quas coram se per somnium pincerna pharaonis inspexit, Fratrum Ordinis Minorum, Sororum inclusarum et Poenitentium collegia designantur , quae sanctae ac individuae Trinitatis dedicata cultui; dum flores opinionis laudabilis, et uvas conversationis honestae proferunt, ac vinum sacrae compunctionis effunditur; multis de fidelium universitate producitur, ut in sanctitate et justitia Domino servientes comprehendant felicitatis aeternae bravium tibi ab aeterno, filia ib Christo caríssima, sicut de pietate divina confidimus praeparatum. 
6 Quis enim fidelium pro constanti non teneat, quod cum tu considerans paupertatis habitum, in quo pro salute humani generis haberi voluit Conditor singulorum, in ancillam pauperem et humilem reginam transtuleritis, olim multis deliciis et honoribus abundantem, percipies perennis thesauri monilia, quae vacando virtutum amplexibus virgo et martyr Agnes beatissima creditur consecuta? Quis Deum timentium plenis non dicat labiis, quod te vacantem virginali munditiae in sponsam sibi elegerit excellentia Redemptoris? 
7 Rogamus itaque devotionem tuam et hortamur in Domino Jesu Christo, quatenus sollicita super his, laudis frequentare canticum; quae gaudentibus Angelis de se providisse dignoscitur praesidens curiae supernorum, ad hoc sine intermissione intentionis tuae summa dirigere studeas; ut quae pluribus in salutis exemplum constituta cerneris, sanctarum concursu comitata virginum in aeterna tandem collocari pátria merearis; nobis super hoc illam percepturis immensitatem laetitiae, quae solet Patri de virtuoso filio et stabilis honoris conseqüente gloriam provenire. 
Datum Laterani VII Idus maii pontificatus nostri anno duodecimo.

TEXTO TRADUZIDO

16. De Conditoris omnium (1238)

À dileta filha Inês, serva de Cristo e da gloriosa Virgem bendita entre as mulheres, saudação e bênção apostólica 
1 Da graça inefável e da virtude do Criador de todas as coisas procede o que o espírito de sua contemplação eleva tão alto no céu que até a profundidade do abismo por ele é penetrada, como se pode intuir da admirável variedade das grandezas de Deus, que expressaste na tua carta tão sincera. 
2 Pois, lendo-a, posso ter a alegria de perceber que tu, que estás no norte, abandonando os confins da terra, que são a cobiça, a vaidade e a voluptuosidade que mantêm nelas presos os olhos dos estultos, fostes ouvir com a rainha do sul a sabedoria do verdadeiro Salomão, perseverando atenta e diligente aos seus pés como numa escola de virtudes, e aí aprendeste plenamente a bondade, a disciplina e a ciência, de modo que, tendo bebido na torrente do seu prazer, agora dele transbordas, proferindo do tesouro de teu peito ora o fervor do desejo novo, ora a tua vontade inabalável de pôr em prática o antigo. 
3 Na verdade, foi sobre isso que ofereceste ao Filho da gloriosa Virgem, por sua clemência, o candor da pureza virginal, de modo que eu posso dar graças, e com o afeto mais profundo do coração te exorto, filha da bênção, a que nessas coisas, que só se realizaram em ti pela virtude de Deus, sem intervenção humana, procures atribuir tudo ao Criador, pois dele, que dispensa admiravelmente todos os bens pelo ministério dos anjos e dos homens, recebem o princípio e o complemento da perfeição, obtendo da devoção a coroa da glória perene, e da fé aos súditos que o seguem, através dos quais realiza-se o mesmo como que por um instrumento agradável de sua vontade. 
4 Assim como, no espelho de nossos contemporâneos, contemplamos o Senhor glorificando a São Francisco, que por vontade do Rei eterno trans-formou-se de repente de espinho em flor, passando para o culto da pureza contínua, depois de ter abandonado os enganos do mundo, dando conta fielmente da missão que lhe fora dada do alto, e entregou ao Filho do Pai eterno um grande lucro, tendo sido instituídos por ele como uma manifestação dos estigmas do Redentor, como acreditam muitas pessoas dignas de fé, e se torna poderoso e muito capaz a cada dia, por todo o mundo, nas três Ordens. 
5 Pois, sem querer, contendo interiormente como que as três descendências que foram vistas pelo padeiro do faraó: a Ordem dos Frades Menores, a das Irmãs inclusas e a dos grupos de Penitentes, como são chamadas, que, dedicadas ao culto da santa e indivisa Trindade, enquanto produzem as flores de uma louvável opinião e as uvas de um honesto comportamento, e se derrama o vinho da sagrada compunção para tantos na totalidade dos fiéis, para que, servindo ao Senhor na santidade e na justiça, conquistem o galardão da felicidade eterna para ti, filha caríssima em Cristo, como creio que foi preparado pela piedade divina. 
6 Pois qual é o fiel que não acredita que tu te transformaste numa serva pobre e numa rainha humilde – olhando para a pobreza que o Criador de todas as coisas quis ter para salvar o gênero humano –, tu que outrora tiveste a abundância de tantos prazeres e honras e agora recebes as jóias do tesouro perene, que sabemos que Santa Inês, virgem e mártir, conseguiu entregando-se aos abraços das virtudes? Quem, entre os que temem a Deus, vai deixar de clamar em voz alta que a excelência do Redentor escolheu-te como esposa, a ti que te entregavas na pureza virginal? 
7 Por isso, no Senhor Jesus Cristo, rogo a tua devoção e te exorto, na medida em que és solicita por essas coisas, que repitas freqüentemente o cântico de louvor; tu que, como sabemos, te abasteceste na alegria dos anjos, confiando tanto na corte celestial. É bom que procures dirigir para isso, sem cessar, toda a intensidade da tua intenção; para que tu, a quem muitos vêem como exemplo de salvação, acompanhada pelo grupo das virgens, mereças finalmente ser colocada na pátria eterna. E a mim, que vou saborear a respeito disso aquela alegria imensa que o Pai tem por um filho virtuoso, conseguindo a glória da honra sem fim. 
Dado em Latrão no dia sétimo dos Idos de maio, no décimo segundo ano de nosso pontificado.