TEXTO ORIGINAL
1 Quodam tempore beatus Franciscus manebat in heremitorio Grecii.
2 Et cum maneret ad orationem de die et nocte in cella ultima post cellam maiorem, quadam nocte in primo somno vocavit socium suum, qui iacebat prope ipsum in cella maiori et antiqua.
3 Qui statim surrexit et ivit ad eum, et introivit atrium illius cellule iuxta ostium, ubi deintus iacebat beatus Franciscus.
4 Et ait beatus Franciscus ad eum: “Frater, non potui dormire hac nocte neque stare rectus ad orationem; nam caput et crura tremunt michi, et videtur michi quod comederim panem de lolio”.
5 Et socius eius loquebatur secum de huiusmodi sibi compatiendo.
6 Et ait beatus Franciscus: “Ego credo quod diabolus manebat in hoc pulvinari quod habeo ad caput”.
7 Acquisiverat enim altera die illud pulvinar, quod erat plenum de penna, dominus Iohannes de Grecio, quem sanctus diligebat magno affectu et cui familiaritatem de se multam demonstravit toto tempore vite sue.
8 Nam postquam exivit de seculo beatus Franciscus noluit iacere in culcitra neque ad caput habere pulvinar de penna occasione infirmitatis, nec aliqua occasione; sed in illa hora coegerunt ipsum fratres ultra voluntatem suam, propter infirmitatem maximam oculorum.
9 Et proiecit illud ad socium suum. Socius eius surrexit et accepit illud cum dextera manu et proiecit illud super spatulam suam a latere sinistro, tenens illud cum dextera manu et exivit extra illud atrium.
10 Et statim perdidit loquelam, et non poterat se movere de illo loco nec poterat sua ducere brachia nec manus, neque poterat dimittere illud, sed stabat ita erectus;
11 videbatur autem sibi quod esset quasi homo extra se positus, qui nichil sentit in se nec in aliis.
12 Et dum sic staret per aliquam horam, ecce per divinam misericordiam vocavit ipsum beatus Franciscus.
13 Et statim in se reversus (cfr. Luc 15,17; Act 12,11) fuit et dimisit post se pulvinar.
14 Et reversus fuit ad beatum Franciscum narrans ei omnia que sibi acciderant.
15 Et ait beatus Franciscus: “In sero cum dicebam completorium, sensi quando diabolus veniebat ad cellam”.
16 Postquam autem verum esse cognovit quod diabolus fuerat, qui impedivit ipsum, ut non posset dormire neque stare erectus ad orationem, cepit dicere ad socium snum:
17 “Nimis est subtilis et astutus diabolus: quoniam ex quo per misericordiam Dei (Rom 12,1) et eius gratiam non potest michi nocere in anima, vult impedire necessitatem corporis,
18 videlicet ut non possim dormire neque stare erectus ad orationem, ad impediendum devotionem et letitiam cordis et ut murmurem de infirmitate”.
TEXTO TRADUZIDO
94. O travesseiro de penas
1 Em certa ocasião, o bem-aventurado Francisco permanecia na eremitério de Grécio.
2 E como permanecia em oração de dia e de noite na última cela depois da cela maior, certa noite, no primeiro sono, chamou seu companheiro, que estava deitado perto dela, na cela maior e antiga.
3 O companheiro levantou-se imediatamente e foi ter com ele. Entrou no átrio daquela cela, perto da porta, onde o bem-aventurado Francisco estava deitado, lá dentro.
4 E o bem-aventurado Francisco lhe disse: “Irmão, não pude dormir esta noite, nem ficar direito para a oração; pois minha cabeça e minhas pernas tremem e até parece que comi pão de joio”.
5 O companheiro conversava com ele sobre isso, compadecendo-se.
6 E o bem-aventurado Francisco disse: “Acho que o diabo estava neste travesseiro em que tenho a cabeça”.
7 Pois o senhor João de Grécio, que o santo amava com muito afeto e a quem demonstrou muita familiaridade durante todo o tempo de sua vida, tinha adquirido no outro dia aquele travesseiro, que estava cheio de penas.
8 Pois, desde quando saíra do século, o bem-aventurado Francisco não quis dormir em colchão nem ter à cabeça um travesseiro de penas nem quando estava doente e nem em nenhuma outra ocasião; mas naquela hora os frades o obrigaram contra sua vontade, por causa de sua grande enfermidade dos olhos.
9 Jogou-o para o seu companheiro. Seu companheiro levantou-se, pegou-o com a mão direita e o jogou sobre seu ombro esquerdo e, segurando-o com a mão direita, saiu daquele átrio.
10 E perdeu a fala na mesma hora, e não podia mover-se do lugar nem mexer com os braços e as mãos, nem largar o travesseiro, mas lá ficou parado.
11 Parecia-lhe que era um homem colocado fora de si, que não sente nada nem em si nem nos outros.
12 Tendo ficado assim por uma hora, eis que pela misericórdia divina o bem-aventurado Francisco o chamou.
13 Voltou a si na mesma hora, foi e jogou fora o travesseiro.
14 E voltou a bem-aventurado Francisco, contando tudo que lhe tinha acontecido.
15 O bem-aventurado Francisco disse: “À tarde, quando eu estava rezando Completas, senti quando o diabo entrou na cela”.
16 Mas depois que soube que fora na verdade o diabo que o impedira, não o deixando dormir nem ficar em pé para a oração, começou a dizer a seu companheiro:
17 “O diabo é espero e astuto demais: pois como, pela misericórdia de Deus e por sua graça não pode me fazer mal na alma, quer impedir a necessidade do corpo,
18 para que eu não possa dormir nem ficar em pé para a oração, para impedir a devoção e a alegria do coração, e para que eu reclame da doença”.