TEXTO ORIGINAL
XXVI- De ferventissimo crueis amore.
Pungit amara crueis Christi compassio mentem
Virginis, ad lacrimas oculos sacra vulnera cogunt.
Diversos anime motus crux ipsa movebat:
Elicit hinc lacrimas, solamina parturit inde;
Passo compatiens lacrimatur virgo; salutem
In cruce dum recolit, plausus et gaudia surgunt.
Temperat hoc fletum, quod restauratio mundi
Ex cruce dependet, quod lacrima dulcis amaros
Detersit fletus, delevit pena reatum,
Plaga luem lavit, livorem vulnus abegit.
Hinc sibi dulcescunt lacrime, compassio mentem
Dulcorat, fit crux lenis, fit passio grata.
Quem sibi fortis amor devinxerat atque profundo
Cordis inherebat, animo non excidit, inmo
Hunc quasi precipuum thesa[u]rum mentis in arca
Servat, persepe memorans, repetensque frequenter.
A[d]monet hinc dominas Christum deflere, suique
Exemplo doces hoc. Cum sepius ista moneret,
Anticipat dicti lacrimarum copia finem;
Dumque crucis Christi distinguit tenpus et horam,
In sexta nonaque suam compunctio maior
Contorquet mentem: clavis stat fixa doloris.
Cum semel orares in nonis, spiritus ille
Nequam percussit maxillam virginis, et sic
Suffudit livore genam, lumenque cruore.
Hec crucis Offitium didicit, velud eius amator
Franciscus docuit, simili quoque more peregit.
Illa precum verba, que pragas quinque recensent,
Ruminat. Hec iubilus, hec sunt sibi cantus amenus.
TEXTO TRADUZIDO
XXVI – O fervorosíssimo amor à cruz.
A amarga compaixão da cruz de Cristo compungia a mente da virgem. As feridas sagradas traziam-lhe lágrimas aos olhos. A própria cruz causava diversos movimentos da alma: deste lado brotavam lágrimas, daquele nasciam consolações. Chorando, a virgem se compadecia daquele que tinha sofrido. Quando lembrava a salvação que houve na cruz, surgiam aplausos e gozos.
Era isso que temperava o pranto: que a restauração do mundo dependeu da cruz, que uma doce lágrima enxugava os prantos amargos, a pena destruiu o reato, a chaga lavou o mal, a ferida acabou com o ferimento.
Por isso as lágrimas tornavam-se mais doces, a compaixão aliviava a mente, a cruz tornava-se leve e a paixão era grata.
Aquele a quem se prendera por um forte amor e a quem estava unida no fundo do coração, não o cortou do ânimo, antes guardava-o como o tesouro principal na arca da mente, recordando-o quase sempre, voltando a Ele com freqüência.
Por isso exortava as senhoras a chorar Cristo e o ensinava com o seu exemplo. Muitas vezes, quando fazia essa exortação, a abundância de lágrimas vinha antes de acabar de falar. E como destacava o tempo e a hora da crucifixão de Cristo, uma compunção maior atormentava a sua mente ao meio-dia e às três da tarde: ficava presa aos cravos da dor.
Uma vez, rezando às três da tarde, o espírito mau deu um tapa no rosto da virgem, deixando-a com a face lívida e o rosto ensanguentado.
Ela aprendeu o Ofício da Cruz, como o ensinara Francisco, que o amava, e o rezava de modo semelhante. Ruminava aquelas palavras das orações que lembravam as cinco chagas. Para ela era um júbilo, era um cântico suave.