Página de Estudos das Fontes Pesquisadas

  • Fontes Franciscanas
  • Fontes Biográficas
  • Espelho da Perfeição

TEXTO ORIGINAL

Speculum perfectionis - 4

Caput 4. De novitio volente habere psalterium de licentia ejus.

1 Alio quoque tempore quidam frater novitius qui sciebat legere psalterium, licet non bene, obtinuit a generali ministro licentiam habendi ipsum. 2 Sed quia audiverat quod beatus Franciscus nolebat fratres suos esse cupidos de scientia et libris, non contentabatur illud habere sine licentia beati Francisci.
3 Cum ergo venisset beatus Franciscus ad locum ubi erat ille novitius, dixit ei novitius: “Pater, mihi esset magna consolatio habere psalterium; sed licet generalis minister illud mihi concesserit, tamen vellem ipsum habere de conscientia tua”.
4 Cui beatus Franciscus respondit: “Carolus imperator, Orlandus et Oliverius et omnes palatini et robusti viri qui potentes fuerunt in proelio, persequendo Infideles cum multo sudore et labore usque ad mortem, habuerunt de illis victoriam memorialem; 5 et ad ultimum ipsi sancti martyres sunt mortui pro fide Christi in certamine; nunc autem multi sunt qui ex sola narratione eorum quae illi fecerunt volunt recipere honorem et humanam laudem.
6 Ita, et inter nos sunt multi qui solum recitando et praedicando opera quae sancti fecerunt volunt recipere honorem et laudem”. 7  Ac si diceret: “Non est curandum de libris et scientia sed de operibus virtuosis, quia scientia inflat et caritas aedificat (cfr. 1Cor 8,1)”.
8 Post autem aliquot dies, cum sederet ad ignem beatus Franciscus, idem novitius iterum 1ocutus est ei de psalterio. 9 Et ait illi beatus Franciscus: “Postquam habueris psalterium, concupisces et volueris habere breviarium. Et postquam habueris breviarium sedebis in cathedra tanquam magnus praelatus, et dices fratri tuo: Apporta mihi breviarium”.
10 Hoc autem dicens beatus Franciscus cum magno fervore spiritus, accepit cum manu de cinere, et posuit super caput suum, et ducendo manum super caput suum in circuitu, sicut ille qui lavat caput, dicebat: “Ego breviarium! Ego breviarium!”. Et sic reiteravit multoties ducendo manum per caput. Et stupefactus et verecundatus est frater ille.
11 Postea dixit ei beatus Franciscus: “Frater, ego similiter tentatus fui habere libros, sed ut de hoc scirem Domini voluntatem, tuli librum ubi erant evangelia Domini scripta, et oravi Dominum ut in prima apertione libri ostenderet mihi de hoc suam voluntatem. 12 Et oratione finita in prima apertione libri occurrit mihi illud verbum sancti evangelii: Vobis datum est nosse mysterium regni Dei, ceteris autem in parabolis(Luc 8,10). 13 Et ait: Tot sunt qui libenter ascendunt ad scientiam quod beatus erit qui se fecerit sterilem amore Damini Dei”.
14 Elapsis autem pluribus mensibus, cum esset beatus Franciscus apud locum Sanctae Mariae de Portiuncula, juxta cellam, post domum, in via, praedictus frater iterum locutus est ei de psalterio. 15 Cui beatus Franciscus dixit: “Vade et facias de hoc sicut dicet tibi minister tuus”. Quo audito, frater ille coepit redire per viam unde venerat.
16 Beatus autem: Franciscus, remanens in via, coepit considerare id quod dixerat illi fratri. Et statim clamavit post eum dicens: “Exspecta me, frater, expecta!”. 17 Et ivit usque ad ipsum, et ait illi: “Revertere mecum, frater, et ostende mihi locum ubi dixi tibi quod faceres de psalterio sicut diceret tibi minister tuus”.
18 Cum ergo pervenissent ad locum illum, beatus Franciscus genuflexit coram fratre illo, et dixit: “Mea culpa, frater, mea culpa; 19 quia quicumque vult esse frater Minor non debet habere nisi tunicam, sicut regula sibi concedit, et cordam et femoralia; et qui manifesta necessitate coguntur, calciamenta”.
20 Unde quotquot fratres veniebant ad ipsum pro habendo consilio ejus super hujusmodi, hoc modo respondebat eisdem. 21 Quapropter saepe dicebat: “Tantum habet homo de scientia quantum operatur, et tantum est religiosus bonus orator quantum ipse operatur; nam arbor tantum ex fructu cognoscitur (cfr. Mat 12,33; Luc 6,44)”.

TEXTO TRADUZIDO

Espelho da Perfeição - 4

Capítulo 4. O noviço que queria ter um saltério com sua per­missão.

1 Em outra ocasião, um noviço que sabia ler o saltério, embo­ra não bem, obteve do ministro geral a licença de tê-lo. 2 Mas, como tinha ouvido que o bem-aventurado Francisco não queria que seus frades fossem ávidos de ciência e de livros, não se contentava em possuí-lo sem a licença do bem-aventurado São Francisco.
3 Por isso, quando o bem-aventurado Francisco foi ao lugar onde estava o noviço, ele lhe disse: “Pai, seria uma grande consolação para mim ter um saltério mas, embora o ministro geral me te­nha concedido isso, gostaria de tê-lo com o teu conhecimento”.
4 São Francisco respondeu: “O Imperador Carlos, Orlan­do, Olivério e todos os paladinos e homens valorosos, que foram poderosos no combate perseguindo os infiéis com muito suor e fadi­ga até a morte, alcançaram memorável vitória sobre eles; 5 e, por fim, os próprios santos mártires morreram na luta pela fé de Cristo. Mas ago­ra, há muitos que, só pela narração do que os santos fizeram, querem receber honra e louvor humano”.
6 Do mesmo jeito, também entre nós há muitos que só recitando e pregando as obras que os santos fizeram querem receber honra e glória. 7 Como se dissesse: “Não devemos cuidar de livros e ciência, mas das obras virtuosas, pois a ciência incha, e a caridade edifica” (cf. 1Cor 8,1).
8 Alguns dias mais tarde, estando o bem-aventurado Francisco sentado jun­to ao fogo, o mesmo noviço falou-lhe novamente do salté­rio. 9 E o bem-aventurado Francisco disse-lhe: “Depois que tiveres o saltério, desejarás e quererás ter um breviário. E depois que tiveres o bre­viário, sentarás na cátedra como um grande prelado e dirás a teu irmão: Traze-me o breviário”.
10 Dizendo isso, com grande fervor de espírito, o bem-aventurado Francisco pegou cinza com a mão, colocou-a sobre sua cabeça e girando a mão em círculo; como quem lava a cabeça, dizia: “Eu [quero] o breviário! Eu [quero] o breviário!” E passou a mão pela cabeça, muitas vezes. O frade ficou estupefato e envergonhado.
11 Mais tarde, o bem-aventurado Francisco lhe disse: “Irmão, também eu fui tentado a ter livros, mas, para conhecer a vontade do Senhor so­bre isso, tomei o livro onde estavam escritos os Evangelhos do Senhor e supliquei ao Senhor que, na primeira abertura do livro, me mostrasse a sua vontade sobre isso. 12 Terminada a oração, na primeira abertura do livro apareceu-me a palavra do Santo Evangelho: A vós foi dado conhecer os mistérios do reino de Deus; aos  outros, só em parábolas (Lc 8, 10). 13 E acrescentou: “São tantos os que se elevam com gosto à ciência que será feliz quem se fizer ignorante por amor do Senhor Deus”.
14 Passados muitos meses, estando o bem-aventurado Francisco no lugar de Santa Maria da Porciúncula, perto da cela, atrás da casa, no cami­nho, o predito frade falou-lhe outra vez do saltério. 15 São Francisco disse-lhe: “Vai e faze como te disser teu ministro”. Ou­vindo isso, o frade começou a voltar pelo caminho de onde viera.
16 Mas São Francisco, ficando na estrada, começou a pensar no que tinha dito ao frade. De repente, gritou atrás dele dizendo: “Espera-me, irmão, espera!” 17 Foi até ele e dis­se: “Irmão, volta comigo e mostra-me o lugar onde te disse que fizesses com o saltério como te diria teu ministro”.
18 Quando chegaram ao lugar, o bem-aventurado Francisco ajoelhou-se diante do frade e disse: “Minha culpa, irmão, minha culpa. 19 Pois, quem quiser ser frade menor não deve possuir, como lhe concede a Regra, senão a túnica a corda e os calções; e quem for obrigado por manifesta necessidade, os calçados”.
20 Desde então, sempre que os frades vinham a ele para ter seu conselho sobre esse assunto, respondia-lhes da mesma maneira. 21 Por isso, dizia muitas vezes: “O homem tem tanta ciência quanto faz, e o religioso é bom pregador na medida em que pratica; pois a árvore se conhece somente pelos frutos” (cf. Mt 12,33; Lc 6,44).