TEXTO ORIGINAL
46.
1 Sic enim eos repleverat sancta simplicitas, sic eos innocentia vitae docebat, sic eos cordis puritas possidebat, ut duplicitatem animi penitus ignorarent, quia sicut una fides, ita unus spiritus (cfr. Eph 4,3.5) erat in eis, una voluntas, una charitas, animorum cohaerentia semper, morum concordia, virtutum cultus, conformitas mentium et pietas actionum.
2 Nam dum cuidam sacerdoti ex saecularibus, qui meritis valde infamis erat et enormitate scelerum ab omnibus contemnendus, confiterentur saepe peccata sua et per multos eis innotuisset illius nequitia, nullo modo tamen credere voluerunt, nec propterea omiserunt peccata sua ei solito confiteri, nec debitam impendere reverentiam.
3 Et quidem cum ipse vel alius sacerdos cuidam e fratribus quadam die dixisset: “Vide, frater, ne sis hypocrita”, statim, propter sacerdotis verbum, credidit se frater ille hypocritam esse.
4 Propter quod die ac nocte lamentabatur, nimio dolore affectus.
5 Quaerentibus autem ab eo fratribus, quid sibi vellet tanta moestitia et tam insuetus moeror, respondit dicens: “Sacerdos quidam tale verbum mihi locutus es, de quo tanto dolore afficior quod vix possum aliud cogitare”.
6 Consolabantur autem eum fratres, et ne sic crederet hortabantur.
7 Quibus ipse dicebat: “Quid est quod dicitis, fratres? Sacerdos est qui locutus est verbum hoc, potestne mentiri sacerdos?
8 Cum ergo sacerdos non mentiatur, necesse igitur est ut quod locutus est, verum esse credamus”.
9 Sicque diu in hac simplicitate perdurans, verbis tandem patris beatissimi acquievit, qui ei verbum sacerdotis exposuit et eius intentionem sagaciter excusavit.
10 Vix alicui fratrum tanta posset mentis inesse turbatio, quod ad eius ignitum eloquium (cfr. Ps 118,140) non discederet omne nubilum rediretque serenum.
TEXTO TRADUZIDO
46.
1 A tal ponto tinham-se enchido de simplicidade, aprendido a inocência e conseguido a pureza de coração, que detestavam toda falsidade e, como tinham a mesma fé, tinham também o mesmo espírito, uma só vontade, um só amor. Eram sempre coerentes, procediam de acordo, cultivavam as virtudes, procuravam ter as mesmas opiniões e ser igualmente generosos no que faziam.
2 Confessavam-se freqüentemente com um padre diocesano, que tinha muito má fama e merecia o desprezo pela enormidade de seus pecados. Muita gente chamou a atenção deles para a maldade do padre, mas não quiseram acreditar de maneira nenhuma e nem por isso deixaram de confessar-se como de costume, nem lhe perderam o respeito.
3 Uma vez, esse ou um outro sacerdote disse a um dos frades: “Irmão, não sejas hipócrita!” O frade, por ser a palavra de um sacerdote, logo ficou pensando que era mesmo um hipócrita.
4 Lamentava-se por isso dia e noite, muito penalizado.
5 Perguntaram- lhe, então, os frades por que estava tão triste e donde lhe vinha esse abatimento incomum, e ele respondeu: “Um padre me disse que sou hipócrita, e isso me doeu tanto que nem consigo pensar noutra coisa”.
6 Para o consolar, os irmãos disseram que não devia acreditar nisso.
7 Mas ele respondeu: “Que estais dizendo? Foi um padre que me disse isso.
8 Como um padre não pode mentir, precisamos acreditar no que ele disse”.
9 Permaneceu muito tempo nessa simplicidade, acalmando-se afinal pela palavra do santo pai, que lhe explicou melhor o que o padre tinha dito e desculpou sabiamente sua intenção.
10 Dificilmente podia algum frade ficar tão perturbado que sua palavra ardente não lhe afastasse qualquer dúvida e não lhe devolvesse a serenidade.